Por Daniel Covolo Mazzo
Resolvi escrever esse artigo pois, ultimamente, venho recebendo constantes questionamentos a respeito de quanto tempo uma terapia deve durar, sobre sua regularidade e se é possível obter resultados promissores em poucas sessões. Esse tipo de interpelação se dá, principalmente, por conta de questões financeiras. A maioria dos planos de saúde restringe as sessões de terapia em um determinado número anual; desse modo, o terapeuta passa a ficar limitado e se sente compelido a adotar práticas terapêuticas breves.
Obviamente, um ambiente terapêutico adequado, caracterizado por escuta privilegiada, acolhimento e devolutiva do conteúdo enunciado pelo cliente, alivia preliminarmente a angústia. Frequentemente, já nas primeiras sessões, a pessoa se sente melhor. Isso é um ótimo sinal para a ciência da Psicologia, pois indica a alta efetividade da psicoterapia. Certamente um pequeno número de sessões de terapia, como comentado, será benéfico para o cliente; contudo, esse breve tratamento seria o suficiente? Observando a pergunta pela perspectiva de terapia direcionada por sintomas, eu diria que há inúmeros estudos e pesquisas publicadas relatando a efetividade dos tratamentos curtos em relação à melhoria dos sintomas. Porém, importo-me muito com essa ciência tão florescente nos tempos atuais, pois estamos em um momento de apresentá-la às pessoas que estão dispostas a obter mudanças significativas, ricas e promissoras, pois os benefícios em longo prazo serão muito maiores.
Estudo realizado a respeito de terapia de longo prazo
Abrangendo 4.000 entrevistados com queixas de problemas emocionais nos três anos anteriores à pesquisa, um estudo realizado pela University of Pennsylvania1 por 25 anos, que é considerado uma das maiores análises elaboradas até hoje, foi categórico: A terapia leva tempo!
O estudo demonstra que a terapia começa a surtir efeitos por volta de seis meses após o início das sessões. Já os pacientes que permanecem em terapia pelo período de um ano sentem os resultados com mais intensidade. E, consequentemente, em três anos de tratamento observaram-se benefícios ainda maiores. Concluindo: quanto mais tempo a pessoa permanecer em tratamento psicoterápico, mais benefícios ela receberá.
A análise indica que a maioria dos clientes ficou muito satisfeita com o atendimento realizado. Eles relataram melhoria significativa na qualidade de vida e obtiveram mais resiliência ao lidar com os problemas cotidianos. Este resultado também inclui as pessoas com quadros mais graves no início do tratamento. Porém, observou-se piora após a restrição dos tratamentos pelos planos de saúde. Essa informação sugere que os resultados positivos de psicoterapia em poucas sessões precisam ser revistos, com mais estudos e observação por parte dos terapeutas e cientistas.
Tratando-se de pesquisas na área de Psicologia Clínica, a maioria se concentra em um número de sessões preestabelecidas, conduzidas de acordo com manuais e critérios de aplicação e avaliação. É uma espécie de guia específico para pesquisa, estabelecido entre 8 a 12 sessões. Estou comentando sobre isso pois as pesquisas sobre terapias com número limitado de sessões geralmente focam no alívio dos sintomas específicos relatados na anamnese e se houve melhoria ou controle sob determinada condição ou transtorno.
Já as terapias mais longas, evidentemente, estabelecem critérios logo no início para tratar as questões que mais afligem os pacientes, buscando identificar seus sintomas e focando em suprimi-los; no entanto, visam também à melhoria geral de outros aspectos das pessoas, deixando-as com a consciência mais expandida e, consequentemente, mais madura. Tratando-se de pesquisa científica para levantar informações sobre terapia em longo prazo, é um trabalho muito mais difícil, porém o estudo da University of Pennsylvania obteve êxito nesses quesitos.
O pesquisador que conduziu o estudo atentou-se para algumas prerrogativas básicas de terapia de longo prazo – por exemplo, mudanças de estratégias adotadas pelo terapeuta no curso da terapia ou até mesmo ações e intervenções não previstas em sua abordagem. Isso se deve a supervisões clínicas, estudos de casos realizados pelo profissional e até mesmo alterações de suas próprias cognições, proporcionadas pela sua terapia pessoal. É necessário incluir desistências, contratempos, relatórios de centenas de sessões etc. Enfim, é um estudo robusto, complexo e delicado, mas foi possível. Tudo isso sugere que tal exame foi convincente e criterioso.
Como esse estudo é um pouco antigo, seria muito importante que outros estudos dessa natureza estivessem em curso para agregar conteúdo a ele. Isso é fazer uma boa ciência.
O que diz a prática clínica empírica?
Vou responder esse tópico pela minha própria prática clínica. Vejamos, como exemplo, uma pessoa que procura o psicólogo para tratar sintomas relacionados a crises de ansiedade. Naturalmente, como comentei, uso todo protocolo clínico para poder estabilizar o cliente logo nas primeiras sessões, desde a acolhida até chegar às técnicas de dessensibilização sistemática, tão úteis nesse caso. Contudo, se em doze sessões, por exemplo, já com a pessoa se sentindo melhor, o tratamento for finalizado, o paciente pode apresentar piora? Posso dizer com muita segurança, tanto pelos meus casos como pelas conversas com colegas, que sim, a piora pode ser significativa. Mas por que isso ocorre? Que hipóteses podemos atribuir a esse quadro?
A resposta é simples, e afirmo categoricamente: por trás dos sintomas existem causas, e elas precisam ser elaboradas com mais profundidade. Por exemplo: uma pessoa deprimida pode ter tido sua autoestima comprometida? Se sim, por quanto tempo? Em inúmeros casos, percebi que as pessoas convivem com problemas de autoestima desde sua tenra infância. E como se pode reestruturar isso?
Pois bem, por isso enfatizo que a terapia leva tempo e demora um pouco para começar a surtir efeito. Isso ocorre em todas as situações mais complexas em que o ser humano tem de se adaptar a mudanças. Por exemplo, aprender a apontar um lápis é bem diferente de aprender um novo idioma. A Neurociência chama esse processo de neuroplasticidade cerebral. Na Psicologia, parte do nosso trabalho é remodelar comportamentos, apresentar novos padrões de consciência e mostrar as nuances obscuras da consciência do cliente, sendo que ele pode optar por alterá-las.
A psicoterapia realiza o lindo e extraordinário trabalho de tratar a personalidade como um todo. São padrões que a pessoa aprendeu de acordo com os ambientes em que vive durante toda a sua vida: sua maneira de pensar, de lidar com os outros, de sentir, experienciar e se comportar diante da sociedade. Eu fico imensamente feliz quando obtenho esses resultados: o cliente apresenta determinada queixa; nós tratamos do problema; ele colabora maciçamente no seu processo; exploramos os sentimentos experimentados durante a relação terapêutica; e, consequentemente, os resultados positivos frente à personalidade do indivíduo começam a se apresentar. Isso é bom para o terapeuta, ótimo para o cliente, e, como consequência, há um contágio de bem-estar entre as pessoas que os cercam. Uma verdadeira corrente do bem.
Aí se apresenta outro ponto de interrogação: isso é fácil? Diria categoricamente que não. Absolutamente nada que exige uma transformação mais profunda é fácil; logo, também não é barato. Considere aprender piano, dirigir ou dominar uma profissão; são mudanças simples no curso da vida? A terapia é a mesma coisa, porém é um investimento para si mesmo, e isso será inestimável para todos nós.
Habilidades do psicoterapeuta
Estou abordando esse assunto pois ele é necessário por se tratar de terapias mais longas. Para o êxito de qualquer processo terapêutico, algumas características são necessárias por parte do profissional. Algumas delas já mencionei no início desse artigo; outras considero essenciais, como vínculo adequado e íntimo entre terapeuta e cliente, escuta autêntica, cuidadosa, e valorização dos elementos que o indivíduo percebe estarem sendo silenciados no ambiente em que convive. Também destaco a devolutiva das narrativas realizadas pelo cliente durante a sessão e a percepção concreta, por parte dele, que o terapeuta está ali, ao lado dele, durante todo o tempo estipulado entre as partes.
Porém, existe algo essencial que devo salientar em relação às terapias mais longas: o terapeuta também deve investir em sua terapia pessoal. Todos nós carregamos padrões, como comentei, que são disfuncionais. Como nossos comportamentos são reflexos deles, é indispensável que sejam percebidos no tratamento. Dessa maneira, o profissional tem mais possibilidades de ajudar e tratar do outro, podendo fazer intervenções valorosas em comportamentos que poderiam passar despercebidos por um terapeuta que não faz terapia.
A terapia de longo prazo pode causar dependência?
Esse medo é muito comum e está entre comentários que ouço e perguntas que recebo constantemente. Esse receio frequentemente é associado ao tempo de permanência no tratamento. As pessoas entendem que caso se mantenham em terapia por muito tempo, já estariam dependentes do terapeuta ou da terapia, mas não é bem assim.
O que eu posso esclarecer sobre isso é que o tempo de terapia não tem relação com a questão da dependência. Um cliente pode ficar totalmente dependente de um terapeuta despreparado em apenas duas sessões, ao passo que outro pode permanecer dez anos em terapia e manter sua individualidade absolutamente protegida – inclusive com a ajuda do terapeuta.
Então, é importante observar como o relacionamento entre as partes se dá. O cliente está delegando ao terapeuta suas próprias tomadas de decisão? O terapeuta está exercendo algum controle sobre o cliente? O cliente se sente perdido quando o terapeuta tira férias, por exemplo? Esses podem ser indícios de dependência. Na verdade, a boa terapia conduz o indivíduo para o processo de autoconhecimento e autodesenvolvimento pessoal.
Conclusão
Por meio dessas observações, sejam elas científicas ou empíricas, já é possível afirmar que a terapia mais longa faz muito bem ao ser humano. É um grande investimento para a pessoa que a escolhe e pode repercutir de modo muito positivo para quem convive com ela.
Referência bibliográfica:
Consumer Reports. (1995, November). Mental health: Does therapy help? pp. 734-739.
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